É pelo estômago que a mulher prende o homem. O dito, radicado na experiência que conduz à sabedoria popular, perdeu quase inteiramente o sentido, nestes tempos em que as prendas femininas deixam lugar subalterno para a arte culinária e seduções inerentes. Não é menos verdade, no entanto, que o estômago e seu reconforto continua em alta na masculina - ainda que não só - maneira de viver.
Come-se muito em Portugal. Alguém o nega? Come-se sempre bem? Duvida-se e com razão. A inquestionável evidência é que a gastronomia permanece como uma paixão dos portugueses e que, para alívio dos tementes, comer ganhou estatuto de acto cultural, de algum modo remetendo a gula - um dos sete pecados mortais - para o baú das velharias.
Avançando para o que verdadeiramente (nos) interessa, digamos que se come muito e bem nas terras barrosãs e que ninguém incorre no risco de tormentos infernais por causa disso. Mais, para que não restem dúvidas: se os deuses soubessem e cuidassem dos mimos da gastronomia, vinham morar ou passar férias - no Barroso, acomodavam-se no escano, ao aconchego da lareira, e regalavam-se com presunto e chouriça assada na brasa, regando e perfumando toda a cena com grandes copázios de vinho maduro transmontano. Coisa de merenda, porque, ao jantar ou à ceia, mãos prestimosas lhes serviriam um opulento cozido à barrosã, que usa e abusa levar do melhor que o reco fornece: pernil, orelheira, chispe, naco de presunto, salpicão, chouriça, sangueira e chouriço de abóbora, gostosa gordura para as couves, nabos e batatas da horta.
Deixemos as celestiais criaturas em soninho de ripanço e falemos de mais iguarias, que o cardápio não se fica pelo porco fumado: há o cabrito estufado, o cabrito assado e o cabrito de caldeirada, que o montês ruminante consente afeiçoar-se de várias maneiras. Respondem à chamada, ainda, a chouriça com grelos e a alheira de apurado recheio. E não falta à mesa, olha a novidade, a vitela barrosã, que dispensa adjectivações mas que, no impulso, leva a que se faça eco dos que juram ser esta a melhor carne do mundo e arredores, podendo apresentar-se assada, cozida, frita ou grelhada, sempre vistosa e olorosa e descartando o mínimo receio de defraudar - hipótese impensável - os mais requintados palatos. Acrescente-se, em abono da verdade, que todos estes pratos, sobretudo o cozido - de preferência feito no pote e ao lume das achas da lareira -, se aprimoram na qualidade quando cozinhados no Barroso.